segunda-feira, abril 28, 2008

A carteira*

De repente, Gustavo deu conta de que estava sem sua carteira. Começou a suar frio e logo o desespero havia tomado conta de sua mente, Haveriam-na achado? Haveriam-na vasculhado? Não, isso não poderia ter acontecido. Não naquele dia, não com aquela carteira.
Saber o porquê do desespero de Gustavo só é possível com uma voltinha no passado. Gustavo estava apaixonado. Por uma bela mulher, aliás. Bela mulher, esta, que agora ele lembrava, era esposa de seu amigo Honório.
As coisas aconteceram realmente rápidas. A apresentação à Honório, a cumplicidade adquirida, a aproximação à família e logo, Gustavo tomara D. Amélia em seu braços. Estaria aí a explicação que Honório buscava para o fato de que toda vez que este punha os pés em sua casa, Gustavo fazia dela seu refúgio e o olhava com olhos desconfiados.
Ansioso por demonstrar ainda mais seu amor por Amélia, Gustavo escrevera um bilhete apaixonado, que agora se encontrava em sua carteira perdida. Falava do prazer indizível que sentia ao estar na presença de tão bela mulher, ao ouví-la tocar piano e ao arrepiar-se por causa dos sussuros de amor da voz de algodão que ela possuía.
Temia agora que alguém descobrisse. Tamanho seria o escândalo de vizinhos e seu escritório de advocacia logo estaria às teias de aranhas. Que advogado honrado era esse, que amava e possuía, em lençóis sujos, a mulher de seu amigo?
Para que estivesse preparada para qualquer coisa, Gustavo corre para a casa de Honório, para contar tudo para sua amada.
- Amélia, precisas saber do desastre que aconteceu.
E Honório abordara os dois, entrando pela porta da frente de supetão, fazendo com que Gustavo e D. Amélia não pudessem disfarçar tal angústia. Honório sorria e perguntou a Gustavo se lhe faltava algo. "Falta-te a vergonha na cara, seu traidor!"
- Nada.
- Nada?
- Por quê?
- Mete a mão no bolso, não te falta nada?
- Falta-me a carteira. Sabes se alguém a achou?
- Achei-a eu. Pegue.
- Mas conheceste-a?
- Não, achei teus bilhetes de visita.
E foi para o banheiro sem nem cumprimentar D. Amélia. Honório só o fazia depois de seu banho, mas isso aumentou ainda mais a aflição de Gustavo. Abriu sua carteira e como se quanto antes o fizesse, mais rápido se livraria do peso na consciência, entregou o bilhete a D. Amélia. Esta sorriu com o mais belo sorriso que tinha e rasgou em incontáveis pedaços a sua infidelidade narrada.

*Releitura de "A carteira" de Machado de Assis

Bjos ;*
e obrigada pra quem teve MUITA paciência de ler essa baboseira =D